sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Menina das Árvores

Por Ciro M. Costa

Muitas pessoas não irão gostar desse texto. Primeiro, porque ele é dividido em 9 partes. Segundo, porque não se trata de nenhuma comédia ou aventura, e sim mais uma daquelas histórias bonitas que dificilmente são contadas hoje em dia. Bom, hoje senti vontade de contar uma história bonita, e aqui está ela, pra quem quiser gostar. Ou chorar. Ou as duas coisas...

PARTE I DE IX



Na época em que a conheci, ainda estava no ginasial. Acho que tinha uns 16 ou 17 anos. Estavam começando os anos 80, década em que a criatividade da humanidade ainda estava em alta. Época colorida, boas músicas, boas lembranças, surgia a banda U2... e em meio a tantas coisas boas, eu a conheci.
Meu nome é Joshua. Nenhum de vocês me conhece. Mas basta se lembrar de sua época de escola. Enquanto você estava lá brincando com seus amigos de pique-pega, eu era aquele cara que já estava namorando a menina mais bonita da escola. Você ouvia as meninas comentarem o quanto aquele casal era bonito, e sentia a inveja no tom de suas vozes, pois queriam estar no lugar da namorada. E você, muitas vezes, quis estar no meu lugar. Pois bem, aqui estou. (Goste você ou não).
Mas a garota que disse que conheci no início dessa história não era essa namorada. Na verdade, você pensa que as coisas eram perfeitas pra mim, não é? Namorava a moça bonita, e tudo já estava perfeito. Enquanto você venerava a mulher mais bonita com seu amor platônico e passou as noites ensaiando a maneira mais cinematográfica de conquistá-la (e nunca teve coragem pra isso), eu já estava lá. E você acha que era tudo mesmo perfeito.
Bem, mas não era. Enquanto você me invejava, eu invejava você. Sei lá, talvez a adolescência não seja uma época ideal pra namorar. Talvez devêssemos aproveitar de outra forma. Primeiro temos que aprender a superar as coisas sozinhos, depois sim, acompanhados. É como eu penso.
Naquela época as coisas começaram a ficar difíceis pra mim. Eu ainda não trabalhava e minha mãe era do lar. Meu pai estava com sérios problemas de saúde, e estava com os dias contados.
- Vá para casa e aproveite o máximo que puder. – lhe disse o médico.
- Mas quanto tempo ainda tenho? – perguntou meu pai.
- Talvez uma semana. Talvez um mês. Quem sabe um ano...
Creio que ao ouvir aquilo, meu pai preferiu mil vezes morrer em 1 minuto. Era durão e orgulhoso demais, e jamais aceitaria ficar em casa “aproveitando” os últimos dias com a família.
- Joshua, quero que venha comigo para o armazém. Tudo aquilo será seu um dia e quero que comece a aprender o serviço. – ele me disse certa manhã, me acordando bruscamente.
- Mas pai... eu não quero...
- Vamos logo! Quem vai cuidar da sua mãe depois que eu morrer?
- Mas e a escola...
- Você tem aula só à tarde! Todas as manhãs irá comigo pro armazém e vai aprender também a conciliar as duas coisas. Está na hora de virar homem, rapaz!
Amaldiçoei meu pai para os quatros ventos naquela manhã, mas não tive escolha. Sabem, fiquei realmente furioso. Pensei: “ele nunca me dá atenção, nunca conversa comigo... e agora quer que aprenda seu serviço?”. Mas com um pequeno intermédio de minha mãe, eu fui.
Pra completar, meu relacionamento estava indo por água abaixo. Sheila, minha bela namorada na época, começou a ter ciúmes doentios que vinham do nada. Sei lá o que acontecia com aquela garota! Será que eu estava fazendo coisa errada sem perceber? O caso é que nossas brigas foram ficando cada vez mais rotineiras. Havia algo faltando ali e eu sentia que muita coisa já não fazia mais sentido. Sheila era uma moça espetacular, simpática, bonita (como já disse)... mas não sei. Eu já não sabia se aquilo era mesmo amor. E ainda faltava esse ‘algo’ que não consegui descobrir naquela época, e não estava com paciência pra saber. Havia os problemas, meu pai... e não tive coragem de continuar com aquele relacionamento. Em meio a muitas lágrimas, nós terminamos. Ou melhor, eu terminei. Fora uma das decisões mais difíceis da minha vida.
O colégio inteiro soube da notícia no dia seguinte. Magno, um de meus melhores amigos, não acreditava:
- Cara! Você terminou com a Sheila! Como é isso???
- Ué!? Terminamos. Não deu certo. Acabou simplesmente.
- Não consigo imaginar você sem ela. Desde que te conheço que vocês namoram!
- Pois é! Mas agora você vai me conhecer solteiro, amigo!
Embora eu parecesse tranqüilo, estava sofrendo por dentro. E ainda estava bastante confuso.
Pra piorar, as coisas no armazém não estavam fáceis também. Um casal de funcionários de lá definitivamente estavam querendo dificultar as coisas pra mim. Acredito que eles tenham vibrado com a notícia de que meu pai estava com os dias contados, mas ficaram surpresos ao descobrir que aquela joça não ficaria pra eles, e sim para o filho bobo e único do dono. Será? Será que existem pessoas com pensamentos tão ruins assim? Às vezes gosto de acreditar que não. Mas acreditem, elas existem.

Depois de uma semana difícil, resolvi adotar um hábito saudável: caminhar. Guardei meu dinheiro do ônibus e comecei a caminhar pra casa depois da aula. Era bom. Fazia-me pensar e resolver minhas dúvidas da época. Sentia-me bem. Comecei a me sentir melhor no dia em que cortei caminho por aquele parque, cheio de árvores (coisa rara hoje em dia). Aquele lugar sempre me chamara a atenção. Era um desses lugares que a gente sempre promete que “vai lá qualquer dia” e nunca dá certo (ou nunca queremos que dê certo).
Pois naquele dia eu fui, e me sentei um banco, de frente para várias árvores. Nunca fui bom pra guardar nomes de árvores. Aliás, pra mim foram sempre todas iguais. Sei lá se eram jequitibás, sucupiras ou seringueiras. Eram árvores. Algumas cheias de galhos, prontas pra serem escaladas. Outras mais altas, mas não menos verdes.
Foi então que, olhando para uma delas, vi, lá no alto, a moça mais bonita que já conheci em toda a minha vida. Ela estava lá, comendo uma fruta em cima de um galho, e nem me olhou com seus olhos azuis no primeiro momento. Fiquei olhando insistentemente (acreditem, sem querer), até que ela finalmente percebeu minha presença.
- Você quer? – ela gritou.
- E-eu?
- E quem mais?
- S-sim, eu...
- Vem pegar.
Meio sem jeito, eu fui.

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